ZEN E A CERIMÔNIA DO CHÁ
Notas:
IChigo Ichie- significa um encontro, um momento- que não vai se repetir jamais!
Com estas palavras já de conotação Zen, convido-os a adentrarem ao Chanoyu- a Cerimônia do Chá.
Rikyu o grande mestre tornou a cerimônia um Do –o Chado- e eu quero lhes repetir suas palavras hoje a vcs. Agora
“Que o Coração que busca seja seu mestre!”
Sejam todos bem-vindos!
A relação da filosofia Zen com a cerimônia do Chá começa desde que o monge zen Eisai levou as sementes do chá verde da China para o Japão.
Shuko o pai da cerimônia estudou Zen sob a orientação do monge Ikkyu do templo Daitoku-ji. A estreita afinidade entre ensinamentos zen e a cerimônia ajudaram a moldar a forma e os rituais do chanoyu e a simplicidade e pureza inerente na religião influenciaram a forma que a cerimônia foi adquirindo. De fato a mesma harmonia da mente conseguida ao se entrar num templo zen pode ser encontrada na serena atmosfera que envolve a sala de chá
Para se compreender a cerimônia seria necessário se conhecesse um Chashitsu tradicional, e o que significa uma prática que contem elementos externos para se chegar ao conhecimento interno, ao auto- conhecimento.
Desde o caminho sobre pedras, deixando para trás a mundaneidade, a purificação das mãos e da boca, o calçar branco, o abaixar-se para adentrar no recinto são princípios básicos para quem entra no mundo do chá. A atmosfera da sala, o barulho da água fervendo no chagamá, a escolha dos objetos, o cuidado com o preparo do chá, como oferecer junto do chá o melhor de si mesmo são pontos importantes para um aprendiz do Chado.
Nos mosteiros zen o trabalho é fundamental. Atividades manuais evitam que a mente se disperse em excesso de meditação.Vemos aqui uma ligação importante com a cerimônia do chá em que cada ato, cada movimento exige a conexão profunda da pessoa consigo mesma, a respiração, a postura do corpo, a concentração da mente.
Sem o ascetismo exacerbado da disciplina hindu, o budismo procura o equilíbrio entre a disciplina e o fruir do que se recebe da natureza. A simplicidade evita a ganância. O zen combate a aquisição desenfreada que tem levado o mundo a um estado de exploração e miséria. Qualidades importantes nos templos Zen são úteis em todas as épocas: frugalidade, não desperdiçar os bens da natureza, simplificação da vida, controle dos desejos, não desperdício do tempo, auto-independência.
O zen fala de simplicidade deixando de lado as representações lógicas, verbais, preconcebidas ou deformadas. Pela simplicidade vem a liberdade, a vitalidade, a originalidade.
E por ser livre também é disciplinado, e não libertino. Na relação entre a cerimônia e o zen, a aprendizagem ritual, concentra a pessoa no que esta fazendo e a torna livre internamente. A respiração acompanha os movimentos, liberando a pessoa de tensões e concentrando-a no próprio ato. Esta atitude se estende aos seus hábitos. A pessoa começa a perceber, a contemplar o que antes lhe era estranho ou desconhecido. As sutilezas das coisas ficam expostas. Há um enriquecimento de intuições, emoções, a pessoa
Chegar ao satori- a aquisição de um novo ponto de vista, olhando para a essência das coisas, longe do dualismo, da lógica verbal, da compreensão intelectual. Não se pode adquirir esta experiência através de conhecimentos formais, nem através de ensinamentos puramente intelectuais. O que pode ser dado são pistas, sugestões (como os koans), mas cada um agarra e segura com experiência pessoal.
Modéstia, respeito e reverência fazem parte das atitudes no recinto do chá. E como no Zen, o que passou, passou, não é possível voltar atrás e refazer a experiência. Os movimentos da cerimônia, se se tornarem atrapalhados vão prosseguir sem serem refeitos. Ichigo-Ichie- um encontro- uma vida, uma vez apenas, sem repetição. Sem pensamentos de punição, nem de elevação. Simples, corretos, despojados. Não há necessidade de representar nada. A igualdade de condições são fundamentais no recinto do chá, ainda que possa ter um convidado especial. Este contudo não é reverenciado por seus méritos ou posses. Qualquer pessoa pode ser o convidado principal. O despojamento de ornamentos durante a cerimônia, assim como antigamente os samurais depositavam suas espadas antes de entrarem no Chashitsu, iguala os participantes em sua importância.
O amor pela cerimônia de monges levou-os a desenvolverem senso estético, colecionando objetos bonitos como utensílios que depois se tornaram valiosos. Tanto que alguns abades desaconselhavam aos monges a cerimônia por acharem-na presa a futilidades estéticas.
Os conceito de Wabi e Sabi vão contra esta pretensa futilidade pois que o requinte não está no preço de um objeto mas na sua simplicidade, sua história, sua idade. A dedicação na confecção de um único dogo de chá é mais importante do que a produção de lindas peças em série. Esta estética wabi/ sabi está intrinsecamente ligada à cerimônia do chá.
Conceitos como wabi/sabi, são de difícil explicação em palavras da mesma forma que explicar o que é Zen e a experiência do chá. São vivências intransferíveis. Em sua totalidade Zen é uma experiência pessoal. Evita a dissociação, revela-se na aparente vida comum. Retira o místico do misticismo. “Abre os olhos do homem para o grande mistério que diariamente é representado. Alarga o coração para que ele abranja a eternidade do tempo e o infinito do espaço em cada palpitação e faz-nos viver no mundo como se estivéssemos andando no jardim do Éden. Todas essas conquistas espirituais são obtidas sem necessidade de qualquer doutrina, simplesmente afirmando, da maneira mais direta a verdade que jaz em nosso ser interno(D.T Suzuki)
Para Sen O Tanaka, embora haja relações entre a ética do zen e o chanoyu eles diferem da seguinte maneira: enquanto o zen apela pela iluminação individual através da meditação e isolamento, chanoyu é antes de tudo a arte da comunicação entre as pessoas compreendendo o espírito do zen na sinceridade e pureza da mente.
Os princípios do Chá expressam valores espirituais mas sua manifestação é a prática entre as pessoas em suas relações.